Retribuição e ajudas de custo

Trabalhador contratado para prestar serviço noutro país

 

A Relação de Évora decidiu apenas considerar como ajudas de custo pagas a um trabalhador, pelas despesas que este teria por estar a trabalhar no estrangeiro, aquelas que a empresa se tenha disponibilizado a adiantar-lhe todas as semanas, excluindo as demais por falta de prova quanto à sua natureza compensatória.

Num processo em que a empresa e o trabalhador tinham acordado o pagamento de 110 euros diários a título de ajudas de custo e ainda a possibilidade daquela lhe adiantar uma verba até 500 euros semanais para fazer face aos custos que este iria ter com alojamento e alimentação no estrangeiro, e que lhe seria debitada no final do mês, a Relação apenas excluiu da retribuição os 500 euros mensais.

Quanto ao excedente, a Relação afirmou que competia à empresa alegar e demonstrar factos donde se pudesse concluir que também se revestia de uma efetiva natureza compensatória das despesas efetuadas pelo trabalhador no cumprimento do seu contrato de trabalho.

Não o fazendo, esse montante tem de ser integrado na retribuição e que ser tido em conta no cálculo dos proporcionais de férias, subsidio de férias e de Natal devidos ao trabalhador no final do seu contrato.

A Relação entendeu, ainda, só ser possível compensar o valor devido pelo trabalhador, pelo desrespeito do prazo de aviso prévio a que estava obrigado para rescindir o seu contrato, aos montantes a pagar pela empresa quando esta o tenha expressamente requerido aquando da contestação da ação que lhe tenha sido movida pelo trabalhador.


O caso

Uma empresa de construção civil contratou um trabalhador para desempenhar as funções de montador em Antuérpia, na Bélgica. A empresa suportava os custos de transporte do trabalhador e pagava-lhe, para além do seu ordenado, ajudas de custo no montante diário de 110 euros, por cada dia que aquele estivesse no estrangeiro. Caso o trabalhador necessitasse de ajuda para contratar alojamento e refeições, a empresa poderia pagar diretamente esses serviços e descontar a despesa nas ajudas de custo. O trabalhador podia, ainda, solicitar adiantamentos do ordenado para custear as despesas com alojamento e alimentação, até ao limite de 500 euros semanais, assinando um vale que seria deduzido no valor a pagar no final do mês.

O trabalhador apenas se manteve ao serviço da empresa durante quatro meses, tendo então decidido rescindir o seu contrato. No entanto, discordou das contas finais feitas pela empresa e recorreu a tribunal reclamando o pagamento da totalidade das ajudas de custo prometidas, bem como o proporcional das viagens prometidas e de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal. Ao valor total seria deduzido o montante correspondente ao aviso prévio de quinze dias, em falta.

A empresa contestou alegando que as ajudas de custo apenas eram devidas por cada dia de trabalho efetivamente prestado, razão pela qual não tinham sido pagas nos dias em que o trabalhador tinha faltado. O tribunal deu razão ao trabalhador e condenou a empresa a pagar-lhe o montante correspondente a vales que tinha indevidamente descontado na sua retribuição, os proporcionais de férias e subsídio de férias e de Natal, bem como a corrigir o valor de um dos vencimentos pagos.

Inconformada com esta decisão, a empresa recorreu para a Relação alegando, para além de diversas nulidades da sentença, que os vales tinham sido devolvidos ao trabalhador após este ter assinado os recibos de vencimento, que as ajudas de custo não deviam ser tidas em conta no cálculo dos subsídios, que estes eram pagos em duodécimos e que o tribunal não tinha tido em conta a falta de aviso prévio por parte do trabalhador.

A Relação rejeitou as nulidades invocadas pela empresa e manteve a decisão anterior, reduzindo apenas os valores dos proporcionais de férias e subsídios de férias e de Natal que o trabalhador tinha a receber. Segundo a Relação, apenas podiam ser consideradas pagas a título de ajudas de custo os montantes que a empresa estava disposta a adiantar ao trabalhador. Quanto a excedente, a empresa tinha que ter provado que esse montante também se destinava a compensar o trabalhador pelas suas despesas. Como não o tinha feito, esse valor tinha de ser considerado parte integrante da retribuição e sobre ele serem calculados os proporcionais de férias e subsídios de férias e de Natal que o trabalhador tinha a receber.

Quanto ao valor reclamado pelo não cumprimento do prazo de aviso prévio, como a empresa não o tinha referido na sua contestação nem pedido o seu pagamento, a Relação não podia proceder à sua compensação.

A empresa viu, assim, confirmada a sua condenação e a obrigação de pagar ao trabalhador um montante muito superior ao que tinha apurado aquando do fim do contrato.

Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, proferido no processo n.º 460/11.4TTSTB.E1, de 10 de janeiro de 2013
Código do Trabalho, artigos 258.º, 260.º n.º 1 alínea a) e 279.º
Código Civil, artigos 344.º n.º 1 e 350.º